História

O embrião

Em meados da década de 1920, o engenheiro britânico Louis Romero Sanson, dono da empresa de construção Auto-Estradas, visto como um futurista, planejou a construção de um resort entre as represas de Guarapiranga e Billings. Juntamente com ele entrou na empreitada o urbanista francês Alfred Agache, que acabara de trabalhar no Plano para Remodelação, Expansão e Embelezamento do Rio. E foi justamente Agache quem viu uma semelhança da região sul de São Paulo com Interlaken, na Suíça.   Começaria a nascer, então, o projeto do bairro Balneário Satélite da Capital, ponto que seria criado justamente visando as classes mais ricas da sociedade. Até mesmo uma praia, com areia vinda de Santos, foi criada junto à represa construída menos de 30 anos antes pela Light.

“Louis Romero Sanson comprou o terreno onde fez o aeroporto de Congonhas e também passou a lotear os terrenos em Interlagos”, conta o historiador Paulo Scali, autor do livro “Autódromo de Interlagos – 1940 a 1980”.

A urbanista e arquiteta Eveline Vieira, que ajudou na elaboração do livro do marido, conta mais. “Foi ele quem fez o aeroporto e também Interlagos. E foi dele a criação da (avenida) Washinton Luís. Ele fez acordo com os donos das granjas que existiam na região e abriu a estrada”, conta ela. “Queriam abrir o acesso a Interlagos para fazer de Interlagos um bairro satélite. Teria um hotel maravilhoso, praia artificial na represa e também teria o autódromo e ainda uma série de outras coisas para as pessoas morarem em Interlagos. Naquela época as pessoas gostavam de morar muito no centro”, completa.Além de casas, o local também teria centros de lazer e um ginásio esportivo. O plano ia bem até estourar a crise de 1929, nos Estados Unidos, e a revolução de 1932 em São Paulo.

Sem dinheiro, o projeto esfriou e só passou a ganhar força no meio da década seguinte. E isto graças ao sucesso que as corridas de automóveis passou a obter no país (principalmente no Rio e em São Paulo).

Em 1936, São Paulo recebia a sua primeira prova internacional, mas o circuito foi as próprias ruas da capital. E após a (má) repercussão do acidente da piloto francesa Hellé-Nice, que perdeu o controle de seu Alfa Romeo e atropelou e matou cinco pessoas e feriu mais de 30, Interlagos voltou a ganhar a atenção.

O trágico acidente e ainda a paixão pelo automobilismo não deixaram morrer a necessidade de a cidade ter um autódromo.

Tendo o Automóvel Clube do Brasil como co-responsável na elaboração do projeto, Sanson priorizou a criação e construção do circuito de Interlagos, em um traçado que fez inspirado nas pistas de Indianápolis, nos Estados Unidos, Brooklands, na Inglaterra, e Monthony, na França. A construção do autódromo foi cercada de grande expectativa. Em abril de 1939, no autódromo em obras, um grupo de pilotos liderado por Manoel de Teffé, deu as primeiras voltas na pista. A população paulistana ainda teve que esperar mais um ano para a grande inauguração, adiada em duas ocasiões no mês de novembro daquele ano.

A inauguraçăo

Com a estrada de Interlagos aberta e a ponte de madeira sobre o Jurubatuba, Sanson inaugurou um grande e espaçoso estacionamento para carros, e o Hotel Interlagos para receber os turistas.
Era o ano de 1940, quando o bonde de Santo Amaro partia da estação na região sul de São Paulo sempre às 7h30 em direção ao Largo do Socorro, as rádios Cruzeiro e Cosmos anunciavam a cobertura de provas de automobilismo, o Barão de Teffé revisava sua Maserati para as provas, o piloto Chico Landi requisitava 500 litros do então chamado álcool-motor com a desculpa de prestigiar o produto nacional, proibia-se os treinos nas imediações do autódromo para preservar a segurança dos operários que ainda concluíam as obras, e morria nos primeiros treinos o piloto Joaquim Simões Souza em um acidente com seu Ford de competição.

Chico Landi na pole position

A corrida inaugural, porém, era transferida por vários motivos. O último adiamento, sabe-se, foi em razão de uma fortíssima chuva que alagou a pista e a tornou inviável para os carros, provocando ameaças de protestos e “sérios desgostos”, como contam os registros dos jornais da época.
Os ingressos voltaram a ser vendidos (as gerais, sem direito a cadeira, custavam 5 contos, um lugar na arquibancada numerada, 30 contos, e os camarotes cobertos para seis pessoas, 400 contos), com descontos de 50% para os sócios do Automóvel Club do Brasil e para os acionistas da Auto-Estradas até que, em uma festiva e aguardada tarde do dia 12 de maio de 1940, finalmente o autódromo foi inaugurado, com a disputa de uma prova preliminar entre motocicletas, que teve largada às 13 horas, com 12 voltas na pista completa, em um total de 96 quilômetros, e o Grande Prêmio São Paulo, destinado a automóveis de corrida, que largaram às 14h30 para as 25 voltas da pista completa, totalizando 200 quilômetros de percurso.

Uma multidão de 15 mil pessoas compareceu à abertura do primeiro autódromo do Brasil, já nas primeiras horas da manhã daquele dia 12 de maio, excitadas e curiosas em assistir a tudo o que fosse possível, desde a chegada dos pilotos ao circuito, até a preparação das máquinas e de seus motores

Chico Landi e Marivaldo acompanham corrida

O tumulto foi geral, com os poucos policiais deslocados para o autódromo encontrando dificuldades para conter os torcedores mais ousados, que insistiam em se aproximar o máximo possível dos lugares destinados aos boxes e, até mesmo, da própria pista.
A entrada principal não passava de um portão feito com algumas ripas de madeira, onde só passava uma pessoa de cada vez. Ao lado, destinado para ser a bilheteria, um pequeno barraco de alvenaria em cuja parede podia-se ler em letras mal escritas à mão e tinta o aviso de que “senhas não são fornecidas”.

Não havia pavimentação, e o chão era de terra batida. Apesar da cobrança de ingressos, só pagava quem realmente quisesse, já que o entorno do autódromo, bastante amplo, era cercado única e exclusivamente com uma tosca cerca de arame farpado, proporcionando a possibilidade de entrar por entre os seus largos vãos. Com isso, o movimento de venda de bilhetes anunciado foi em torno dos cinco mil, ainda assim uma proeza para aqueles tempos.

Coisa comum no Brasil daqueles tempos, e com a alegação da Auto-Estradas S.A. de que a verba destinada à construção havia acabado, o autódromo era inaugurado sem que o projeto original tivesse sido concluído. Dessa forma, não haviam arquibancadas, boxes, guard-rails, lanchonetes, banheiros, torre de cronometragem e de transmissão.

Tudo era na base do improviso, mas a pista estava lá e Interlagos foi aprovado para receber corridas pelo Automóvel Club do Brasil.

O circuito antigo

O traçado, na verdade, foi desenhado para oferecer duas Versões. Uma era um anel externo, concebido para ser de alta velocidade e que tinha 3.250 metros.

O outro era o chamado circuito completo que, contando com o setor do miolo, de 4.750 metros, totalizava os 8 mil metros de extensão. A outra novidade é que se corria em sentido anti-horário ou, como diziam, contra os ponteiros do relógio. Não à toa, o engenheiro Sanson e sua equipe haviam escolhido um local bastante apropriado para receber a pista. O terreno formava uma espécie de bacia, cercada por morros mais altos.

O traçado foi construído no fundo dela, e as partes mais altas recebiam o público que tinha uma visão fantástica de quase 90% da pista. Para ligar o setor mais alto perto da entrada ao local reservado para os carros e seus preparadores na parte mais baixa, o paddock, onde hoje é a Reta dos Boxes, foi construída umapassarela de madeira, também utilizada para receber material de publicidade e como ponto de largada e de chegada das provas.

Ciro Cayres, em prova da Mecânica Nacional em Interlagos

Os carros largavam dali e partiam para a Curva 1, onde poucos metros depois havia um bosque de eucaliptos sem nenhuma proteção que impedisse um choque no caso de uma saída da pista. Depois, sempre em alta velocidade, vinha a Curva 2, o Retão, as Curvas 3, 4, uma pequena reta até chegar à Curva da Ferradura, trecho de média velocidade.

A aceleração voltava a crescer na descida para a Curva do Lago, que existe até hoje, e era em subida, como a Reta Oposta, que desembocava na Curva do Sol, de altíssima velocidade, e chamada assim porque nos finais da tarde os pilotos tinham de encarar o sol de frente. Na saída dela, outra descida para a Curva do Sargento, homenagem a um militar com essa graduação que ali morreu atropelado, onde se tinha de frear fortemente.

Assim que a Curva do Sargento era contornada, se chegava à subida da Curva do Laranja, versão da época para denominar os pilotos que não conseguiam contorná-Ia com o pé no fundo do acelerador. Surgia então a parte mais lenta do traçado.

A Curva do S, de baixa velocidade, emendava na Curva do Pinheirinho porque realmente havia um par de pinheiros bem ali, ao lado da pista, e na Curva do Cotovelo, que depois virou Bico de Pato, pelo seu formatomesmo, parecido com o bico da ave, a curva mais lenta da pista.

Depois dela, a velocidade aumentava novamente na descida da Curva do Mergulho, porque o carro seguia em direção imaginária ao lago, seguia uma reta curta até a Curva da Junção (porque ela ficava na interseção como anel externo), até a Curva do Café, também chamada por alguns como a Curva da Vitória, por ser a última antes da Reta dos Boxes, onde tudo começava novamente.

1970 - Reinauguraçăo

No final de 1967, o Autódromo foi fechado para reformas e voltou a funcionar no dia 29 de fevereiro de 1970, ainda que não estivesse totalmente pronto, mas em grande estilo, com a realização de uma corrida do Campeonato Internacional de Fórmula Ford. Para delírio do público, um jovem magrinho em início de carreira recebeu a bandeira quadriculada em primeiro lugar. O nome dele era Emerson Fittipaldi.

Grid de prova de protótipos anos 1970

Os jornais contam que, mesmo a pista tendo sido recapeada, com novos boxes erguidos, além das arquibancadas para 20 mil torcedores, o público teve de enfrentar um novo problema, os congestionamentos monstros para chegar e sair do Autódromo.  “No dia 30 de novembro, depois de assistir a uma corrida com a participação de volantes americanos, 25 mil pessoas foram pegas desprevenidas pela gigantesca armadilha formada pelas ligações viárias próximas ao Autódromo. E tiveram de esperar por mais de três horas para chegarem aos seus destinos’: registrou um periódico no dia seguinte.

Assim, Interlagos passou por outra reforma em 1971 para abrigar no ano seguinte, pela primeira vez, um Grande Prêmio de Fórmula 1.

José Carlos Pace e Emerson Fittipaldi em premiação da F-2

Finalmente recebeu alambrados nas áreas dos boxes, zebras na pista, túnel para acesso ao interior do circuito, um edifício de quatro andares para abrigar as transmissões de rádio e televisão, mais a tribuna de honra. Também foram executadas obras para instalar galerias de águas pluviais, guias, sarjetas, e outras de infraestrutura.

Ainda em outubro de 1971, o primeiro grande teste de Interlagos, que recebeu uma corrida internacional de Fórmula 2 extra-campeonato, também vencida por Emerson Fittipaldi, com Ronnie Peterson em segundo, para que a pista fosse homologada e passasse a fazer parte do calendário oficial da categoria mais rápida do planeta.

Emerson vence GP Brasil de 1974

A era Fórmula 1

Com o circuito testado pelos dirigentes da Federação Internacional de Automobilismo, em 1972 a Fórmula 1 finalmente chegava ao palco da velocidade de Interlagos, mesmo ainda não sendo uma etapa oficial. Como não contava pontos para o campeonato, nem todas as equipes vieram para São Paulo. Nessa prova correram quatro pilotos brasileiros e mais oito estrangeiros. Em 30 de março de 1972, o Autódromo sediou pela primeira vez uma corrida da categoria. A competição, entretanto, não contou pontos para o campeonato mundial. A corrida foi vencida pelo argentino Carlos Reutemann, seguido pelo sueco Ronnie Peterson e pelo brasileiro Wilson Fittipaldi Jr.
Com o sucesso do evento, o Brasil passou a integrar, já no ano seguinte, o calendário oficial do Campeonato Mundial de Fórmula 1. A primeira prova brasileira aconteceu em 11 de fevereiro de 1973 e foi vencida por Emerson Fittipaldi, seguido pelo escocês Jackie Stewart e pelo neozelandês Dennis Hulme.

Aprovado, Interlagos foi sede do GP Brasil de F-1 de 1973 até 1977.

Em 1978, o GP foi disputado em Iacarepaguá, Rio de Janeiro.

Em 1979 e 1980, voltou para Interlagos. No ano seguinte, retomou para Iacarepaguá, no Rio porque a prefeitura de São Paulo estava sem verbas para deixar o evento e o autódromo nas condições exigidas pela FIA.

Nesse período, o Autódromo de Interlagos recebeu campeonatos como os de Fórmula Ford, 2 e 3, Super Vê, Fórmula vw, Turismo e Stock Car.

Encontro de gerações: Emerson, Landi e Senna, em evento em Interlagos, em 1983

Em 1985, em uma homenagem ao grande piloto do automobilismo brasileiro, o Autódromo recebeu o nome de José Carlos Pace, que havia morrido em 1977.

No final de 1989, aconteceu o inverso: a prefeitura do Rio de Janeiro não teve verba para manter o evento e a prefeita de São Paulo na época, Luiza Erundina, e o então presidente da Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA), Piero Gancia, uniram esforços e trouxeram o GP do Brasil de volta para a cidade.  O Autódromo de Interlagos passou por uma série de reformas, com construção de novos boxes e torre de controle, e o percurso foi encurtado para 4.325 km, de acordo com a tendência atual de circuitos com no máximo 4.500 m de extensão.

A reinauguração aconteceu no dia 23 de março de 1990. A corrida foi vencida pelo francês Alain Prost, com o austríaco Gethard Berger em segundo lugar e o brasileiro Ayrton Senna em terceiro. Desde então, melhoramentos têm sido introduzidos a cada ano, mantendo sempre o circuito atualizado, acompanhando a constante evolução do automobilismo.

Vencedores dos grandes prêmios realizados em Interlagos

O novo traçado

Para isso, os organizadores da categoria exigiram que o Autódromo e o traçado de Interlagos se adequassem à nova filosofia da Fórmula 1.

A pista, com 7.960 metros de asfalto irregular, com curvas de alta velocidade e áreas de escape insuficientes não tinha mais condições de receber os modernos carros da categoria, embora o traçado fosse comparado por pilotos de fora do país aos de Spa-Francorchamps e Nurburgring.

A opção foi por um traçado menor, com 4.325 m, e a curva em S sugerida pelo campeão mundial Ayrton Senna, que ficou conhecida como o “S do Senna” Foram construídos 23 novos boxes, nova sala de imprensa, sala para fotógrafos, torre de cronometragem e de direção de prova, um moderno centro médico e instalações de apoio para as equipes e prestadores de serviço. Interlagos ficou moderno.

A reabertura aconteceu no dia 23 de março de 1990. A corrida foi vencida pelo francês Alain Prost, seguido pelo austríaco Gerhard Berger, com Senna em terceiro. No início de 2000, a pista foi recapeada e passou a ter 4.309 metros de extensão. Em 2002, algumas caixas de brita foram asfaltadas, como no “S” do Senna, na Curva do Lago e na do Laranjinha.


Em 2007, a pista foi refeita para retirar desníveis e irregularidades recebendo um asfalto com uma tecnologia das mais modernas, instalação de dutos de drenagem e nova entrada para os boxes. Na Curva do Mergulho, uma área de escape, mais segura, foi construída, além de arquibancadas fixas de concreto na Reta dos Boxes, que aumentaram a capacidade para 25 mil torcedores, com banheiros e salas multiuso na parte de baixo.

Em 2008 foi feita a construção de mais um outro módulo de arquibancadas fixas para mais 10 mil espectadores, além da cobertura em definitivo da área do Paddock, a construção de um novo hospital, dentro dos padrões exigidos pela Formula 1 e construção de 2 áreas , com 5.000 metros quadrados, para abrigar os HCs.

Em 2009 foram feitas reformas de infraestrutura em vários pontos de Interlagos e a alteração do muro na curva do café, com o objetivo de oferecer mais segurança aos pilotos.